21 de set. de 2011

Prefeito da Congregação para o Clero REAFIRMA o “não” ao celibato opcional e a ordenação feminina.


Zenit

O Cardeal Mauro Piacenza (foto) prefeito da Congregação para o Clero, raramente intervém no debate público. Quando o faz, como nesta ocasião, o faz para fechar a porta para o celibato opcional (“mais de 40% dos matrimônios fracassam. Entre os sacerdotes a desistência é de apenas menos de 2%”) ou ao sacerdócio da mulher (“João Paulo IIfechou definitivamente a questão”).

Eminência, com surpreendente periodicidade, há várias décadas, voltam a aparecer no debate público algumas questões eclesiais, sempre as mesmas. A que se deve este fenômeno?

Na história da Igreja sempre houve movimentos “centrífugos” que tendem a “normalizar” a excepcionalidade do Evento Cristo e de seu Corpo vivo na história, que é a Igreja. Uma “Igreja normalizada” perderia toda a sua força profética, não diria mais nada ao homem e ao mundo e, de fato, trairia o Seu Senhor.

A grande diferença da época contemporânea é doutrinal e midiática. Doutrinariamente, pretende-se justificar o pecado, não confiando na misericórdia, mas deixando-se levar por uma perigosa autonomia que tem o sabor do ateísmo prático; do ponto de vista midiático, nas últimas décadas, as fisiológicas “forças centrífugas” recebem a atenção e a inoportuna amplificação dos meios de comunicação que vivem, de certa maneira, de contrastes.

Deve-se considerar a ordenação sacerdotal das mulheres uma “questão doutrinal”?

Certamente, como todos sabem, a questão já foi enfrentada por Paulo VI e pelo beato João Paulo II e este, com a Carta Apostólica Ordinatio Sacerdotalis de 1994, fechou definitivamente a questão.

De fato afirmou: “Para que seja excluída qualquer dúvida em assunto da máxima importância, que pertence à própria constituição divina da Igreja, em virtude do meu ministério de confirmar os irmãos (cf. Lc 22,32), declaro que a Igreja não tem absolutamente a faculdade de conferir a ordenação sacerdotal às mulheres, e que esta sentença deve ser considerada como definitiva por todos os fiéis da Igreja”. Alguns, justificando o injustificável, falaram de uma “definitividade relativa” da doutrina até esse momento, mas francamente esta tese é tão pouco comum que carece de qualquer fundamento.

Então, não há lugar para as mulheres na Igreja?

Pelo contrário, as mulheres têm um papel importantíssimo no Corpo eclesial e poderiam ter outro mais evidente ainda. A Igreja foi fundada por Cristo e não podemos determinar, nós seres humanos, seu perfil, portanto a constituição hierárquica está ligada ao Sacerdócio ministerial que está reservado aos homens. Mas, absolutamente nada impede a valorização do gênio feminino em papéis que não estão ligados estreitamente ao exercício da ordem sagrada. Quem impediria, por exemplo, que uma grande economista fosse chefe da Administração da Sé Apostólica? Ou que uma jornalista competente se convertesse na porta-voz da Sala da Imprensa do Vaticano?

Pode-se multiplicar os exemplos em todos os campos não vinculados à ordem sagrada. Há uma infinidade de tarefas nas quais o gênio feminino poderia dar uma grande contribuição! Outra coisa é conceber o serviço como um poder e querer introduzir, como faz o mundo, as “cotas” de tal poder. Considero, além disso, que o menosprezo do grande mistério da maternidade, que se está realizando nesta cultura dominante, tenha um papel muito importante na desorientação geral que existe em relação à mulher. A ideologia do lucro reduziu e instrumentalizou as mulheres, não reconhecendo a maior contribuição que estas, indiscutivelmente, podem dar à sociedade e ao mundo.

A Igreja, além disso, não é um governo político no qual é justo reivindicar uma representação adequada. A Igreja é outra coisa, a Igreja é o Corpo de Cristo e, nela, cada um é membro segundo o que Cristo estabeleceu. Por outro lado, a Igreja não é uma questão de papéis masculinos ou femininos, mas de papéis que implicam, por vontade divina, a ordenação ou não. Tudo o que um fiel leigo pode fazer, também o pode fazer uma fiel leiga. O importante é ter a preparação específica e a idoneidade; o fato de ser homem ou mulher é secundário.

Mas pode haver uma participação real na vida da Igreja sem atribuições de poder efetivo e de responsabilidade?

Quem disse que a participação na Igreja é uma questão de poder? Se fosse assim se cometeria o grande erro de conceber a própria Igreja não como é, divino-humana, mas simplesmente como uma das muitas associações humanas, talvez a maior e mais nobre, por sua história; e deveria ser “administrada” repartindo-se o poder.

Nada mais distante da realidade! A hierarquia da Igreja, além de ser de direta instituição divina, deve ser entendida sempre como um serviço à comunhão. Só um erro, derivado historicamente da experiência das ditaduras, poderia conceber a hierarquia eclesiástica como o exercício de um “poder absoluto”. Que se pergunte a quem é chamado a colaborar com a responsabilidade pessoal do Papa com a Igreja Universal! São tais e tantas as mediações, consultas, expressões de colegialidade real que praticamentenenhum ato de governo é fruto de uma vontade única, mas sempre o resultado de um longo caminho, em escuta do Espírito Santo e da preciosa contribuição de muitos. Acima de tudo dos bispos e das Conferências Episcopais do mundo. A Colegialidade não é um conceito sócio-político, mas deriva da comum eucaristia, do affectus que nasce do alimentar-se do único Pão e do viver da única fé; do estar unidos a Cristo Caminho, Verdade e Vida; e Cristo é o mesmo ontem, hoje e sempre!

O poder que Roma ostenta não é muito grande?

Dizer “Roma” significa simplesmente dizer “catolicidade” e “colegialidade”. Roma é a cidade que a providência escolheu como lugar do Martírio dos Apóstolos Pedro e Paulo e o que a comunhão com esta Igreja significou sempre na história: comunhão com a Igreja universal, unidade, missão e certeza doutrinal. Roma está a serviço de todas as Igrejas, ama todas as Igrejas e, não poucas vezes, protege as Igrejas que estão em dificuldades pelos poderes do mundo e por governos que nem sempre são plenamente respeitosos com o imprescindível direito humano e natural que é a liberdade religiosa.

A Igreja deve ser considerada a partir da Constituição Dogmática Lumen Gentium doConcílio Vaticano II, incluída obviamente a Nota Prévia ao Documento. Ali está descrita a Igreja das origens, a Igreja dos Padres, a Igreja de todos os séculos, que é a nossa Igreja de hoje, sem descontinuidade; que é a Igreja de Cristo. Roma é chamada a presidir na Caridade e na Verdade, únicas fontes reais da autêntica Paz cristã. A unidade da Igreja não é o compromisso com o mundo e sua mentalidade, mas o resultado, dado por Cristo, da nossa fidelidade à verdade e da caridade que seremos capazes de viver.

Me parece sugestivo, a este respeito, o fato de que hoje só a Igreja, como ninguém mais, defende o homem e sua razão, sua capacidade de conhecer a realidade e entrar em relação com isto, em resumo, o homem em sua integralidade. Roma está ao pleno serviço da Igreja de Deus que está no mundo e que é “uma janela aberta” ao mundo. Janela que dá voz a todos aqueles que não a tem, que chama a todos a uma contínua conversão e por isto contribui – muitas vezes no silêncio e com sofrimento, pagando por sua parte, às vezes em impopularidade – para a construção de um mundo melhor, para a civilização do amor.

Esse papel de Roma não cria problemas para a unidade e o ecumenismo?

Nem sequer o que se pressupõe. O ecumenismo é uma prioridade na vida da Igreja e uma exigência absoluta que provém da oração do Senhor: “Ut unum sint”, que se converte para todo cristão em um “mandamento da unidade”. Na oração sincera e no espírito de contínua conversão interior, na fidelidade à própria identidade e na comum tensão da perfeita caridade dada por Deus, é necessário comprometer-se com convicção para que não haja contratempos no caminho do movimento ecumênico.

O mundo precisa da nossa unidade e, portanto, é urgente continuar comprometendo-se com o diálogo da fé com todos os irmãos cristãos, para que Cristo seja o fermento da nossa sociedade. Também é urgente se comprometer com os não-cristãos, ou seja, no diálogo intercultural para contribuir unidos na edificação de um mundo melhor, colaborando com as obras do bem e para que uma sociedade mais humana se torne possível. Roma, também nessa tarefa, tem um papel de motivação única. Não temos tempo para divisões; o tempo e as energias devem ser empregados para nos unir.

Nessa Igreja, quem são e que papel têm hoje os sacerdotes?

Não são nem assistentes sociais, nem funcionários de Deus! A crise de identidade é majoritariamente aguda nos contextos mais secularizados, ali onde parece que não há lugar para Deus. Os sacerdotes, entretanto, são os de sempre, são os de sempre, são o que Cristo quis que fossem! A identidade sacerdotal é cristocêntrica e, portanto, eucarística. Cristocêntrica porque, como recordou tantas vezes o Santo Padre, no sacerdócio ministerial “Cristo nos atrai para dentro de Si”, implicando-se conosco e implicando-nos na sua própria Existência. Esta atração “real” acontece sacramentalmente, portanto, de maneira objetiva e insuperável, na Eucaristia da qual os sacerdotes são ministros, ou seja, servos e instrumentos eficazes.

A lei sobre o celibato é tão insuperável? Não se pode mesmo mudá-la?

Não se trata de uma simples lei! A lei é consequência de uma grande realidade que se toma só na relação vital com Cristo. Jesus disse: “quem puder entender, entenda”. O sagrado celibato não se supera nunca, é sempre novo, no sentido de que através dele, a vida do sacerdote se “renova”, porque se dá sempre em uma fidelidade que tem em Deus, sua própria raiz e no florescer da liberdade humana, o próprio fruto.

O verdadeiro drama está na incapacidade contemporânea de realizar as escolhas definitivas, na dramática redução da liberdade humana que se transformou em algo tão frágil que não persegue o bem nem quando se reconhece ou se intui como possibilidade para a própria existência. O celibato não é o problema, nem podem constituir, as infidelidades e debilidades de sacerdotes, um critério de juízo.

Além disso, as estatísticas nos dizem que mais de 40% dos matrimônios fracassam. Entre os sacerdotes a desistência é de menos de 2%, portanto, a solução não está na opcionalidade do sagrado celibato. Não será, quem sabe, que se deva deixar de interpretar a liberdade como “ausência de vínculos” e de definitividade, e iniciar a redescoberta de que na definitividade a doação ao outro e a Deus consiste na verdadeira realização e felicidade humana?

E as vocações? Não aumentariam caso se abolisse o celibato?

Não! As confissões cristãs, onde não existindo o sacerdócio ordenado não existe a doutrina e a disciplina do celibato, encontram-se em um estado de profunda crise em relação às “vocações” de guia da comunidade. Da mesma maneira que há crise do sacramento do matrimônio uno e indissolúvel.

A crise da qual se está saindo lentamente, na realidade, está ligada fundamentalmente à crise da fé no Ocidente. É preciso se comprometer com o crescimento da fé. Esse é o ponto. Nos mesmos ambientes está em crise a santificação da festa, está em crise a confissão, está em crise o matrimônio, etc. A secularização e a consequente perda do sentido do sagrado, da fé e de sua prática, determinaram e determinam também uma importante redução do número de candidatos ao sacerdócio.

A estas razões teológicas e eclesiais, se acrescentam algumas de caráter sociológico: a primeira de todas foi a notável diminuição da natalidade, com a conseguente diminuição de jovens vocacionados. Também este é um fator que não se pode ignorar. Tudo está relacionado. Talvez se coloca premissas e depois não se quer aceitar as consequências, mas estas são inevitáveis.

O primeiro e irrenunciável remédio para a diminuição das vocações foi sugerido pelo próprio Jesus: “Rezem ao dono da messe para que mande mais operários à sua messe” (Mt 9, 38). Este é o realismo da pastoral vocacional. A oração pelas vocações, uma intensa, universal, ampla rede de oração e Adoração Eucarística que implique todo o mundo, é a verdadeira e única resposta possível à crise da falta de vocações. Ali onde o comportamento orante é vivido de forma permanente, pode-se afirmar que se leva a cabo uma real recuperação.

É fundamental, além disso, atender à identidade e à especificidade na vida eclesial, de sacerdotes, religiosos – estes na peculiaridade dos carismas fundacionais dos próprios Institutos de pertença – e fiéis laicos, para que cada um possa, verdadeiramente e em liberdade, compreender e acolher a vocação que Deus pensou para ele. Mas, cada um deve ser autêntico e deve diariamente se comprometer para se converter no que é.

Eminência, nesse momento histórico, se fosse dizer uma palavra para resumir a situação geral, o que diria?

Nosso programa não pode ser influenciado por querer estar acima de qualquer custo, por querermos ser aplaudidos pela opinião pública. Nós devemos servir apenas por amor e com amor o nosso Deus no nosso próximo, quem quer que seja, consciente de que o Salvador é só Jesus. Nós devemos deixar que ele passe, que fale, que aja através das nossas pobres pessoas e do nosso compromisso cotidiano. Nós devemos colocar o “nosso, mas também o “dele”. Nós, diante das situações aparentemente mais dramáticas, não devemos nos assustar. O Senhor, na barca de Pedro, parece que dormia, parece. Devemos agir com energia, como se tudo dependesse de nós, mas com a paz de quem sabe que tudo depende do Senhor.

Portanto, devemos recordar que o nome do amor, no tempo é “fidelidade”! O crente sabe que Ele é o Caminho, a Verdade e a Vida e não é “um” caminho, “uma” verdade, “uma” vida. Portanto, a coragem da verdade às custas de receber insultos e desprezos é a chave da missão em nossa sociedade; é esta coragem que se une com o amor, com a caridade pastoral que deve ser recuperada e que torna fascinante hoje mais do que nunca a vocação cristã. Queria citar o programa que sinteticamente formulou em Stuttgart o Conselho da Igreja Evangélica em 1945: “Anunciar com mais coragem, rezar com mais confiança, crer com mais alegria, amar com mais paixão”.


Fonte: http://www.comshalom.org/blog/carmadelio/

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