Os últimos dados estatísticos provam aquilo que para muitos era óbvio, antes de se alterar a legislação: três anos depois da despenalização do aborto em Portugal, o número de abortos está a crescer de forma assustadora.
Este ano, foram feitos, em média, 53 abortos por dia.
Na análise a estes números, o diretor de obstetrícia do Hospital de Santa Maria lamenta que as mulheres não tenham compreendido a lei e que não haja mais medidas de prevenção da gravidez.
A realidade é de tal modo assustadora, com os especialistas e defensores da lei a reconhecerem que a prática do aborto é hoje um método anti-concepcional, que só por si deveria levar os responsáveis a reconhecer o erro das teses que defenderam em 2007.
Diante de uma tragédia destas dimensões, o pior que se pode fazer é persistir no erro. Três anos depois, está na altura de se reabrir uma discussão que nunca foi feita de forma honesta. Os que em 2007 defenderam com tanto calor os direitos das mulheres não podem agora ficar calados diante das estatísticas que, em 2010, são reais, ao contrário dos números ilusórios que se debateram há três anos.
Estadão
A descriminalização do aborto, um dos temas mais polêmicos e que mais desgastaram a candidata Dilma Rousseff e o PT na campanha presidencial do ano passado, volta à cena política.
Na 3.ª Conferência Nacional de Políticas para as Mulheres, que será aberta amanhã em Brasília pela presidente, a militância feminista vai cobrar do governo empenho na articulação de um projeto de lei que garanta às mulheres o direito de interromper a gravidez indesejada. Hoje a lei só autoriza o aborto em casos de estupro e de risco de vida para a mãe.
Para o movimento feminista, a descriminalização é considerada direito fundamental – por envolver o livre exercício da sexualidade e a não imposição da maternidade como destino. Para os movimentos de direitos humanos, trata-se de passo decisivo na defesa da saúde feminina: seus representantes argumentam que, na rede de saúde pública, as complicações decorrentes de abortos em condições inseguras aparecem em terceiro lugar entre as causas de mortalidade materna. Mas, para Dilma e o PT, trata-se de terreno minado.
Escaldada com a campanha, quando pressões de grupos católicos e evangélicos a levaram a assinar a carta na qual se declarou contrária ao aborto e favorável à atual legislação, Dilma deve passar ao largo do tema na conferência. Segundo a ministra Iriny Lopes, da Secretaria de Políticas para as Mulheres, organizadora do evento, a presidente se mantém fiel ao que disse como candidata, no ano passado.
“Ela foi muito clara com o Brasil quando afirmou que respeitaria integralmente a legislação”, diz Iriny. “Quanto à mudança da lei, qualquer resolução da conferência deve ser encaminhada ao Legislativo. As mulheres debatem e o governo aceita as decisões da conferência, mas não se pode substituir poderes.”
Além de cobrar apoio a projetos de mudança da lei, a conferência deve exigir do governo melhorias nos serviços de saúde destinados a atender as mulheres nos casos de aborto legal. Segundo relatórios enviados a Brasília pelas conferências estaduais, mulheres com direito ao aborto ainda são maltratadas e discriminadas na rede pública. Algumas sofrem com a falta de informação dos médicos e demora nas decisões judiciais.
Recuo do PT.
Temas relativos ao aborto já fazem parte do 2.º Plano Nacional de Políticas para as Mulheres. Lançado em 2008, durante o governo de Luiz Inácio Lula da Silva, o plano serviu de texto-base para todas as discussões preparatórias da conferência que começa amanhã e que mobilizaram cerca de 200 mil mulheres em todo o País.
Nenhum comentário:
Postar um comentário