Muita gente interpretou e interpreta o Concílio Vaticano II como uma ruptura com o passado. É comum até mesmo em salas de aula de cursos de teologia encontrar professores ridicularizando gostosamente a Igreja "pré-conciliar". Segundo essa mentalidade, antes do Concílio tudo era imperfeito e a Igreja era um museu: autoritária, alienada e afastada do mundo... Após o Concílio, ao invés, tudo é maravilhoso, tudo se faz novo e deve ser fazer de novo! Certamente, tal interpretação é totalmente equivocada. Bento XVI a chama de hermenêutica da descontinuidade. Segundo o Papa, o modo correto de compreender o Vaticano II é a hermenêutica da reforma: na força do Espírito Santo a Igreja viva vai sendo sempre e gradualmente reformada... O Vaticano II é apenas mais um evento desse contínuo processo que vai de Cristo até o fim dos tempos. O Concílio não rompeu com o passado, mas o relê e o reinterpreta no presente... Vejam só algumas frases de Bento XVI, no seu discurso de final de ano à Cúria Romana neste 2005:
“Por um lado, dá-se uma interpretação que gostaria de chamar de 'hermenêutica da descontinuidade e da ruptura'; com freqüência pôde servir-se da simpatia dos meios de comunicação, e também de uma parte da teologia moderna. Por outra parte, dá-se a 'hermenêutica da reforma', da renovação na continuidade do único sujeito-Igreja, que o Senhor nos deu; é um sujeito único do Povo de Deus em caminho”.
“A hermenêutica da descontinuidade corre o risco de acabar em uma ruptura entre a Igreja pré-conciliar e a Igreja pós-conciliar. Afirma que os textos do Concílio como tal não seriam a autêntica expressão do espírito do Concílio. Seriam o resultado de compromissos nos quais, para alcançar a unanimidade, teve-se que lutar contra muitas coisas velhas que hoje são inúteis. No entanto, o verdadeiro espírito do Concílio não se revelaria nestes compromissos, mas nos impulsos para o novo que estão subentendidos nos mesmos: só estes representariam o verdadeiro espírito do Concílio e partindo deles e em conformidade com eles haveria que seguir adiante. Precisamente porque os textos refletiriam somente de maneira imperfeita o verdadeiro espírito do Concílio e sua novidade, seria necessário ir corajosamente mais além dos textos, deixando espaço à novidade na que se expressaria a intenção mais profunda, ainda que todavia não clara, do Concílio. Em uma palavra, não haveria que seguir os textos do Concílio, mas seu espírito…”
Depois de criticar duramente essa hermenêutica da descontinuidade, o Papa alerta para a necessidade de interpretar e viver o Concílio no espírito de continuidade com a grande Tradição da Igreja. Nesta perspectiva, sim, o Vaticano II já deu e continuará dando inúmeros e preciosos frutos à Igreja de Cristo!
O discurso do Santo Padre pode ser lido neste mesmo site, no link "Bento XVI". O Papa faz também um belíssimo elogio a João Paulo II Magno. Acho que vale a pena dá uma olhada...
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