PADRE GABRIELE AMORTH
Famoso Exorcista da diocese de Roma.
Já por várias vezes me foi perguntado, durante entrevistas televisas ou jornalísticas, que meios especiais tem de ter um exorcista, que meios são utilizados para libertar endemoninhados. E talvez tenha desiludido os entrevistados ao responder que o exorcista não tem nenhuma qualidade particular, nenhum meio extraordinário; a sua força está no nome de Jesus.
É tão bela a declaração que Pedro faz em frente ao Sinédrio, quando é preso – repare-se no enorme delito! – por ter curado um coxo. Que força usou Pedro? Qual era o seu misterioso poder? Pedro proclama em voz alta: “É pelo nome de Jesus Cristo que este homem está curado diante de vós. Não existe salvação em nenhum outro, pois debaixo do céu não existe outro nome dado aos homens, pelo qual possamos ser salvos” (At 4,10-12).
“Em meu nome expulsareis os demônios”
Todos nós, exorcistas, presenciamos a força da invocação daqueles aspectos da Paixão de Cristo, sobre cujo valor salvífico a Bíblia tanto insiste. Por isso, experimentamos a eficácia de invocar a força do Sangue de Jesus, das Suas chagas, das Sua cruz, da Sua morte e ressurreição, do Seu lado aberto.
Invocamos de mais o Espírito Santo, porque nada acontece que não seja por obra do Espírito Santo. E invocamos a Virgem Santíssima, aquela que esmaga a cabeça de Satanás e que intercede todas as graças.
Se ainda existem alguns teólogos que não acreditam na meditação universal de Maria, ou seja, que ela é a mediadora de todas as graças, que se meta a fazer exorcismos e verificará pessoalmente esta verdade. Temos o auxílio dos anjos e dos arcanjos, em particular de São Miguel, príncipe das legiões celestes. E temos o auxílio dos santos, muitas vezes de surpresa.
Já por várias vezes tive casos de possessão diabólica que se resolveram também as graças à intercessão de um santo que nunca tinha sido invocado, e de quem os presentes não eram especialmente devotos, mas que, bem no meio de um exorcismo, fazia sentir a sua presença; e a partir desse momento passava a ser invocado para resolver o caso.
Mas há outro aspecto, a respeito dos santos, que quero destacar. Posso iludir-me, mas gostaria muito de estimular os estudos históricos que ainda estão por se realizar.
Gostaria também que se escrevesse uma outra história, a da luta entre os santos e os diabos, ou seja, a luta contínua que houve entre eles e que diz respeito a dois aspectos muito interessantes. Por um lado, os tormentos que os demônios infligiram aos santos, as perseguições e, freqüentemente, as torturas cruentas.
Por outro lado, as vitórias dos santos; e dentre estas vitórias é lógico que, como exorcista, eu tenha, sobretudo ficado impressionado pela freqüência e pela facilidade com que os santos libertam pessoas endemoninhadas. São episódios freqüentíssimos, historicamente comprovados, que lemos na vida dos santos de todos os tempos.
Também durante os três séculos em que a Igreja católica quase pôs de lado os exorcismos – motivo pelo qual, atualmente, nos encontramos com escassez de exorcistas e carências na sua formação -, sempre houve santos libertando pessoas endemoninhadas. Olhando para trás gosto de recordar São Bento, que não era exorcista, e provavelmente não era sequer sacerdote; no entanto, a sua eficácia contra o demônio era tão forte que o Papa Honório III o proclamou patrono dos exorcistas; ainda hoje é muito conhecida e usada a sua medalha de proteção contra o Maligno.
Se olho para tempos mais recentes, gosto de recordar São João Bosco, quer por causa dos tremendos assaltos demoníacos de que foi vítima, quer pela sua eficácia em libertar as pessoas, por vezes só com a sua presença. Cito um caso, ocorrido em finais de sua vida, no dia 4 de junho de 1885: o superior de uma comunidade religiosa de Caem mandou ao Padre Bosco uma jovem atingida por uma gravíssima possessão demoníaca. Nesse período, não havia a certeza se o Padre Bosco iria celebrar missa devido ao seu estado de saúde. Mas nessa manhã celebrou. No fim dos rituais introdutórios, ou seja, ainda no começo da missa, aquela pessoa sentiu-se inteiramente liberada.
No que respeita às minhas experiências não posso deixar de fazer referências ao Padre Pio.
Padre Pio, um grande lutador
O Padre Pio me ajuda, continuamente, no duro mistério de exorcista, fiel a uma velha promessa, que tem mais de quarenta anos.
Quem conhece a vida do Padre Pio sabe bem o quanto o ele teve de lutar, incessantemente, contra o demônio; e quantos sofrimentos e vinganças diabólicas sofreu devido ao seu ministério em favor das almas, resgatando-as do seu poder para as entregar ao Senhor. Foi uma luta incessante, em que se podem identificar algumas etapas fundamentais.
Num escrito precioso enviado as seu diretor espiritual (Padre Agostinho de São Marcos in Lamis), o Padre Pio afirmava que “as aparições diabólicas começaram por volta dos cinco anos de idade e durante quase vinte anos assumiram sempre formas obscenas, humanas, mas sobretudo bestiais”.
A primeira grande luta é narrada numa visão que se pode situar, mais precisamente, quando Padre Pio tinha cerca de cinco anos. A data é incerta, mas a época é essa. Nesse episódio, ele sentiu-se convidado a lutar contra um homem horrível e de “alma tão desmedida que tocava com a cabeça nas nuvens”.
A personagem resplandecente que estava a seu lado (talvez São Miguel) exortou-o a lutar com aquele gigante monstruoso, assegurando-lhe a sua assistência. O embate foi terrível, mas o pequeno Francesco (que era o nome do Padre Pio) levou a melhor, graças ao auxílio daquele personagem misterioso que o tinha encorajado; um personagem misterioso e luminoso.
O horrível gigante foi obrigado a fugir, arrastando atrás de si “aquela grande multidão de homens de aspectos horríveis, no meio de urros, blasfêmias e gritos de atordoar”. Este foi apenas o início, uma visão profética daquilo que viria a ser a sua vida. As frases entre aspas são todas do Padre Pio.
Tal episódio, que Padre Pio sempre considerou muito significativo, terminou com as palavras do personagem luminoso: “Aquele contra quem combateste há de voltar a atacar. Combate como um valente; eu ajudar-te-ei sempre, de maneira a que consigas prostrá-lo todas às vezes”.
Embora os tormentos diabólicos nunca tenham cessado, mesmo nas formas visíveis e extraordinárias, parece-me possível fixar uma segunda etapa significativa, quando Padre Pio foi enviado para Venafro, em outubro de 1911. Era então um jovem sacerdote, pois foi ordenado no dia 19 de agosto de 1910; tinha de se preparar, ele e mais alguns confrades, para o ministério da pregação.
Mas obedecia com tanta freqüência que, por vezes, nem sequer podia celebrar missa. O maligno aparecia-lhe “sob a forma de um gato negro e feio, ou de jovens nuas que dançavam lascivamente, ou ainda de um carrasco que o flagelava”.
Outras vezes aparecia-lhe com o aspecto do seu superior, ou de São Pio X, ou de outras figuras de santos; até com o aspecto do anjo da guarda, ou de Maria Santíssima ou de São Francisco. Quem tem experiência destes truques diabólicos sabe bem quão pode ser perigoso para a alma quando o demônio procura mascarar-se de santidade. O Padre Pio oferecia de tudo para a salvação das almas: deste modo, compreendeu em Venafro, e no meio de tanta luta e sofrimento, qual era a missão sacerdotal para a qual Deus o tinha reservado.
Podemos identificar uma terceira etapa da vida de Padre Pio em São Giovanni Rotondo. Foi aqui que, durante cinqüenta anos de derramamento de sangue por causas de estigmas, o Padre Pio arrancou inúmeras almas de Satanás. Aqui surgiu e cresceu desmedidamente o número dos seus filhos espirituais, que depois passaram a fazer parte dos grupos de oração. Aqui nasceu a Casa Sollievo della Sofferenza (Alívio do Sofrimento).
E, para além das lutas contínuas combatidas no silêncio, várias vezes lhe foram levados endemoninhados por quem rezou, sofreu e suportou pancadas e flagelos. É muito difundida e já foi publicada várias vezes a fotografia do rosto Padre Pio repleto de manchas negras; nesse dia tinha recebido uma pessoa endemoninhada, e de noite o demônio bateu-lhe por várias vezes com a cabeça no chão. Ajudado pelos confrades, que acorreram ao ouvirem o barulho, teve de ser medicado em todo o rosto e, no supercílio, foram necessários cinco pontos de sutura.
Quando fui me encontrar com o Padre Pio pela primeira vez em 1942, nunca pensei que iria visitá-lo durante vinte e seis anos. Era estudante de Liceu, formei-me em Direito e, depois, entrei na Pia Sociedade São Paulo (os “paulinos”, como são conhecidos pelo mundo). Assim que fui ordenado sacerdote, já não me bastava ser filho espiritual do Padre Pio. Começava também eu a ter meus filhos espirituais, gostaria de os ter levado todos a ele mas, entretanto, eu os recomendava.
Foi assim que obtive uma promessa. Certo dia disse-lhe: “Meu querido padre, tenho um grande pedido a fazer-lhe”. Ele encorajou-me a falar, inclinando-se na minha direção e mostrando-me um sorriso largo. E foi então que me abri: “Gostaria que todos os meus filhos espirituais fossem cuidados pelo senhor; se o Padre Pio se encarregar deles, fico tranqüilo”. Sorriu mais uma vez e fechou os olhos para uma breve reflexão. Depois me disse: “Sim, meu filho, está bem”. E eu: “Mas, então, todos eles nunca mais o tratarão por Padre Pio, mas por avô Pio”. Perante esta expressão riu de bom gosto; estava realmente achando graça. No fundo, ele será sempre e para todos o Padre Pio.
Já passaram muitos anos. Lembro-me da última vez que o vi, no verão de 1968 (morreu no dia 23 de setembro desse ano). Dava muita dó assistir à sua Missa celebrada numa cadeira de rodas, esforçando-se muito. Já não era apenas o esforço místico de quem revivia a paixão; mas o esforço físico de quem já não tinha forças.
Os seus filhos espirituais, espalhados pelo mundo inteiro, foram crescendo e continuaram a crescer depois da sua morte. Quem hoje vai a São Giovanni Rotondo fica espantado ao ver tanta afluência de peregrinos, muito mais numerosa do que quando o Padre Pio estava vivo.
Pessoalmente continuei a contar com a sua ajuda e a senti-lo próximo de mim, nos vários cargos que desempenhei. Agora, então, desde que comecei o ministério de exorcista, não tenho a menor dúvida de que todos os que recorrem às minhas orações ficam logo sob a proteção do Padre Pio, sem o saber.
Em algumas ocasiões, a presença do Padre Pio chegou mesmo a ser sensível. Por vezes, os meus pacientes sonharam com ele, ou viram-no a seu lado a assisti-los nos seus sofrimentos. Em várias ocasiões, durante o exorcismo, foi o demônio quem gritou assustado: “Rua daqui com o frade! Não quero este frade!“. E, depois, pressionado pelas minhas perguntas, era obrigado a revelar que, quem ali estava presente era o Padre Pio.
Também tenho que acrescentar que desde que o meu mestre, o padre Cândido, foi chamado pelo Pai para receber o prêmio da glória, no dia 22 de setembro de 1992 (dia de São Cândido e véspera da morte de Padre Pio), também me tem sido de auxílio e a sua presença já por várias vezes me foi acusada pelos demônios. O Padre Cândido considera o Padre Pio um grande santo; e o Padre Pio definiu o padre Cândido como “um sacerdote segundo o coração de Deus”.