Falei quase nada sobre Aids até agora, o que é uma falha, visto que a doença virou uma marca registrada desse continente.
Então é bastante apropriado que eu toque no assunto aqui, em Uganda. Aids é uma obsessão nesse país, quase uma mania nacional. Por onde você anda, vê centros clínicos, ONGs, igrejas, escolas, com aconselhamento de prevenção ou tratamento para HIV/Aids etc. etc. E placas, cartazes, faixas, tudo que se refere à doença.
De vez em quando é bom ver uma história de sucesso nesse continente, só para variar, e o combate à Aids em Uganda é um sucesso inquestionável. Há 15 anos, cerca de 30% da população tinham o vírus; hoje, são 6,5%.
Enquanto outros países perdiam tempo fingindo que nada acontecia, e até negando que HIV cause Aids (como na África do Sul, onde a taxa é de mais de 20%), os ugandenses agiam para conter a doença. Falar sobre o assunto, assumir o problema e discutir candidamente foi o primeiro passo. Mas teve mais.
Uganda trata a Aids de uma maneira como nós nunca faríamos no Brasil. Uma maneira inusitada, para dizer o mínimo. E assumidamente moralista.
Um exemplo do que acontece por aqui: imagine que você é um oficial do governo e precise traçar uma estratégia para reduzir a incidência de Aids junto a caminhoneiros. Em vários países, esse é um grupo delicado: estão sempre longe de casa, cruzam fronteiras, são cercados por prostitutas o tempo todo. São potencialmente um fator de disseminação da doença. E muitos chegam em casa e podem contaminar suas esposas.
A meu ver, a lógica mandaria que se propagandeasse o uso de camisinhas entre caminhoneiros. Mas veja como é o cartaz do governo de Uganda que vi na sede de uma ONG: (em cima)
Diz o pôster: “um motorista responsável se importa com sua família; ele é fiel a sua mulher”. O foco não é tentar fazê-lo se proteger quando dormir com prostitutas. Mas tentar convencê-lo, antes de tudo, a não ter a relação sexual. Parece ingênuo, mas o governo acha que funciona. E talvez funcione mesmo.
No Brasil, a ênfase das campanhas contra Aids é no sexo seguro: use camisinha, em outras palavras. Em Uganda, a promoção dos preservativos é apenas a perna mais fraca de um tripé que conta também com a promoção de abstinência e a fidelidade.
O slogan do governo é ABC: A é a inicial de abstinência, B é de “be faithful”, ou seja fiel, e C é para condom, ou camisinha.
Uganda é um país com forte influência das igrejas católica e evangélicas. O presidente, Yoweri Museveni, é, a exemplo de George Bush, um “born again christian”, ou seja, um cristão renascido, que descobriu sua fé no meio da vida. A primeira-dama, Janeth, é ainda mais religiosa.
Não surpreende, então, que o governo coloque tanta ênfase nas letras A e B. Abstinência é direcionada aos jovens, principalmente de menos de 25 anos, idade média em que eles se casam, incentivando-os a se manter virgens até o altar.
O B é dedicado aos casais, pedindo que sejam fiéis. Só em último caso, se a pessoa não conseguir se abster ou for um pulador de cerca contumaz, vem o C: pelo menos use camisinha.
Percebeu a diferença? O enfoque tradicional em vários países, inclusive no Brasil, é centrar fogo na camisinha. Em Uganda, camisinha é um último caso, quase o recurso dos pecadores.
Hoje conversei com representantes de duas ONGs, esperando ouvir algumas críticas à política do ABC. Nada. Aprovam 100%. Há um consenso nacional em torno do tema. Sobra para organizações estrangeiras descerem o pau, dizendo que é irreal esperar que um jovem de 20 anos se mantenha virgem.
Mas os números estão aí, desafiando o que diz a lógica e a convicção de muitos (como eu). São um tapa na cara dos céticos.
Fonte:
http://penaafrica.folha.blog.uol.com.br/arch2008-05-01_2008-05-31.html
* Fanáticas do aborto protestam na Rio+20 e não se conformam com retirada da expressão “direitos reprodutivos” do documento oficial.
A
presidente Dilma Rousseff discursou nesta quinta-feira no evento “O
futuro que as mulheres querem”, no âmbito da conferência “Rio+20″.
Enfrentou o protesto de feministas inconformadas com a retirada da
expressão “direitos reprodutivos” do documento oficial da conferência.
Dilma deu uma boa resposta, já chego lá, que deveria servir de norte,
diga-se, para o seu próprio governo, que abriga uma abortista fanática
como Eleonora Menicucci (Ministério das Mulheres) e que flerta com a
possibilidade de oferecer no SUS atendimento pré-aborto, sob o pretexto
de adotar política de redução de danos. Já trato do assunto. Vamos a
algumas considerações gerais sobre o assunto, necessárias para que fique
claro do se cuida aqui.
Fosse
eu psicanalista, dedicar-me-ia, com a paixão do entomologista
dissecador, a entender a alma das militantes do aborto. Não conheço
grupo mais fanático. O sectário religioso mais ensandecido, que está
certo de suas prefigurações místicas como dois e dois são quatro, não
tem a mesma paixão pela causa e, em larga medida, o mesmo ódio. A defesa do aborto é uma causa peculiar
porque, à diferença da luta por, sei lá, comida, moradia, terra,
igualdade de direitos etc, pressupõe a morte. Não por
acaso, os grupos abortistas precisam coisificar o feto para que a sua
postulação ganhe a estatura de uma reivindicação justa e humanista.
Não podendo negar que o feto seja vida — e, sendo vida, há
de ser alguma forma de vida: eu me arriscaria a dizer que é “humana”,
não? —, então sacam da algibeira retórica o argumento que consideram
definitivo: “É vida, mas, até o terceiro mês, ainda não tem cérebro,
logo…” Chega-se mesmo a perguntar qual a diferença entre
alguém com morte cerebral diagnosticada — o que permite a extração de
órgãos para transplante — e o feto das primeiras semanas, com o cérebro
não formado. Ora, a diferença é aquela que separa a vida da morte, nada
menos. O feto traz consigo todas as potencialidades do que vive; a morte
cerebral é o prenúncio da fatalidade. No feto, irreversível é a vida;
na morte cerebral, irreversível é a morte do corpo. Não é preciso ser
religioso para reconhecer a diferença entre uma coisa e outra.
Por
que o fanatismo das abortistas? Parecem querer dizer algo assim: “Se é o
nosso corpo a garantir a vida de outro ser — e um feto é “o outro”, ou
estaríamos falando de uma amputação, certo? —, então podemos negar-lhe
essa licença”. Trata-se da apropriação de um dom da
natureza (a reprodução não coube às mulheres em razão de alguma
injustiça primitiva, imposta pela força) para a imposição de uma vontade
contra a natureza desse dom.
Essa
que é uma luta “de gênero” entende que a mulher é apenas o ser político
com o direito de “decidir sobre o seu corpo”. Essa autonomia
corresponderia à superação do que, então, deixa de ser um dom para ser
uma danação: a reprodução. A
mais recente reivindicação das extremistas do aborto é que, também na
esfera legal, os homens sejam alijados da decisão e tenham cassado até o
direito à opinião. A reprodução da espécie passaria a ser um tema
exclusivo das mulheres. Parece-me
uma forma de loucura.
Pois
bem. As ONGs revindicavam que o texto final da Rio+20 defendesse os
tais “direitos reprodutivos”, expressão
generalista e eufemística para “direito ao aborto”. De fato, a
Igreja Católica e outras denominações cristãs se mobilizaram para que a
expressão fosse substituída pela garantia de “serviços de saúde” às
mulheres. As feministas acusam o que consideram uma indevida
interferência da religião no assunto. Ora, por que ela seria
indevida? O direito dos cristãos de se manifestar teria sido suprimido
por alguma instância representativa ampla a ponto de suprimir até mesmo
a liberdade de expressão?
Dilma
discursou, e as feministas fizeram o seu protesto. A presidente retomou
a palavra e lembrou, de maneira apropriada: “É preciso recuar de argumentos para
permitir outros (…) Exercer o multilateralismo implica, necessariamente,
levar em consideração posições diversas. Diversas como? Diversas das
minhas ou da de cada um de nós”. A presidente estava, em suma,
lembrando à fanáticas que a defesa do aborto como um direito universal
está longe de ser um consenso.
As
mulheres — ou os fetos do sexo feminino — são hoje as principais
vítimas do aborto em razão de questões culturais e econômicas. Na China,
por exemplo, a soma do ultrassom com a política oficial do filho único
leva à prática do aborto seletivo em massa. Numa país em que inexistem
os direitos sociais da velhice (sabem como são aqueles comunistas…), os
filhos homens são as únicas garantias dos pais na velhice. Há dias,
por pouco, a Câmara dos Deputados nos EUA não aprovou uma lei — teve
maioria ampla, mas não o suficiente — para punir mãe e médico em caso de
aborto decidido por questão de gênero. Descobriu-se que a interrupçã
legal da gravidez está sendo usada para impedir o nascimento de meninas.
Os democratas de Barack Obama se mobilizaram contra a proposta porque
não aceitam restrições aos tais “direitos reprodutivos”…
Quando vejo “a luta” dos ditos “grupo feministas” em defesa
do aborto em nome “dos direitos da mulher”, pergunto-me que luta de
emancipação é essa que começa por negar às próprias mulheres o direito à
vida.
A
interdição ao aborto foi um dos fatores que fizeram com que o
cristianismo se expandisse primeiro entre as mulheres. Dois mil anos
depois, essa continua a ser uma prática contra as mulheres, só que,
agora, defendida por feministas.
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